O Ministério da Saúde por meio do SUS elaborou uma
série de publicações que reúnem orientações gerais e relatos sobre o “SUS que
dá certo”, chamadas Cadernos HumanizaSUS. O quarto volume desta coleção fala
sobre humanização do parto e do nascimento, e durante sua leitura percebe-se
diversas vezes que um dos fatores para a melhora e a humanização do parto é
justamente a diminuição do uso de ocitocina no soro dado às gestantes em
trabalho de parto. Contudo, uma dúvida ficou no ar, a ocitocina é o hormônio
que ajuda nas contrações durante o parto e auxilia na criação do vínculo materno-fetal,
então por que desestimular seu uso?
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A resposta é bem simples. Com
a ocitocina sintética as contrações que eram doloridas, mas suportáveis,
aumentam de intensidade consideravelmente e se tornam insuportáveis, levando a
mulher a dilatar mais rápido, mas necessitar de anestesia.
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Administração do soro. |
Tal ponto se explica devido à urgência em se fazer o
parto, e por isso aumenta-se as contrações para a expulsão rápida do bebê. Mas então por que sobrecarregar a gestante de
ocitocina? Porque em um ambiente hospitalar a mulher pode não se sentir
totalmente à vontade e com certeza se sentirá insegura, o que inevitavelmente
aumentará os níveis de adrenalina e noradrenalina, sendo que estes atuam de
forma antagônica à ocitocina. Peguemos o exemplo
de uma vaca que produz leite. Se uma vaca sofre
algum estresse, seja no processo de condução até a sala da ordenha, no barulho
excessivo no local ou maus tratos, ocorrerá a liberação de adrenalina e
noradrenalina
Estes hormônios vão causar a contração da
musculatura lisa e vasoconstrição na região dos ductos mamários impedindo que a
ocitocina chegue até as células mioepiteliais da glândula, diminuindo assim a liberação de leite. Além disso,
alguns receptores aos quais a ocitocina se ligaria pode ser ocupado pela
adrenalina. Trocando em miúdos, administra-se
ocitocina sintética para acelerar o parto, a mulher estressada produz
adrenalina (o que interfere no metabolismo da ocitocina). Logo, administra-se
mais ocitocina já que a quantidade usual não está surtindo efeito.
Então como resolver essa situação? Segundo
a Política Nacional de Humanização: “A mulher e sua família tendem a ser
alijados do protagonismo na produção do cuidado; a gravidez tende a ser
transmutada em doença e a mulher grávida em doente, sujeita no pré-natal, no
parto e no pós-parto a intervenções e decisões da equipe de ‘saúde’ sobre seu
corpo e seu modo de cuidar de si e do bebê [...] Trata-se de organizar a
atenção e ofertar tecnologia apropriada para o parto, com recursos que
influenciam o cuidado em saúde: segurança, confiança e tranquilidade para o
adequado transcorrer do parto..” Ou seja, no modelo vigente a mulher é apenas
espectadora do parto e a equipe médica toma toda e qualquer decisão, sendo que
a humanização do parto vai justamente na contramão disso e preza que a mulher
seja a protagonista e que a equipe está ali para ajudá-la e não tomar decisões
por ela.
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Parto na água. |
PS: Durante as pesquisas nós sempre
achamos coisas bem interessantes e dessa vez achamos a história desse casal que
teve todos os filhos no mar porque acreditava que assim seus filhos nasceriam
fortes e nas fotos a mãe parece bem confortável e alegre com este momento de
sua vida, um parto humanizado. Segue o link https://catracalivre.com.br/geral/saude-bem-estar/indicacao/pai-registra-o-nascimento-de-seus-quatro-filhos-no-mar/
Referências
Brasil. Ministério da Saúde. Humanização do parto e do
nascimento / Ministério da Saúde. Universidade Estadual do Ceará. – Brasília:
Ministério da Saúde, 2014. 465 p.: il. – (Cadernos HumanizaSUS ; v. 4.
Disponível em
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderno_humanizasus_v4_humanizacao_parto.pdf>.
Acessado em 22 abr. 2015
PORTAL EDUCAÇÃO. Funções da ocitocina e prolactina na
produção e ejeção do leite. Disponível em:
<http://www.portaleducacao.com.br/veterinaria/artigos/21370/funcoes-da-ocitocina-e-da-prolactina-na-producao-e-ejecao-do-leite#ixzz3YBriWHIf>. Acessado em 22 de
abr. 2015.
Muito interessante o post!
ResponderExcluirA oxitocina na forma sintética também é usada em spray nasal como medicamento para ocasionar a secreção de leite e facilitar a amamentação ou a extração do leite da mama. A substância ativa do spray nasal é um nonapeptídeo sintético idêntico à oxitocina, que é liberada pelo lóbulo posterior da hipófise. Além de provocar contrações rítmicas do útero, ela contrai as células mioepiteliais que circundam os alvéolos mamários, ocasionando a secreção de leite e facilitando a amamentação ou a extração do leite da mama. Quanto a farmacocinética, a oxitocina sintética é absorvida rápida e suficientemente bem, a partir da mucosa nasal, de modo que o efeito sobre a mama ocorre em menos de 5 minutos. No entanto, se for ingerido um volume excessivo de solução spray nasal, a ocitocina é rapidamente inativada no trato digestivo pelas enzimas proteolíticas.
Bom, sempre muito esclarecedores os posts de vocês!
Aguardando o próximo :)
GRUPO L
ResponderExcluirMuito interessante a abordagem do tema nessa postagem do blog. Sabe-se que o trabalho de parto é um evento fisiológico que é controlado por diversos hormônios e entre eles está a ocitocina. Os níveis de todos esses hormônios presentes no momento do parto são regulados de acordo com o andamento do trabalho e do estado físico em que se encontra a mãe e o bebê. A alteração de um só elemento desestrutura toda essa delicada rede, cujas consequências se estendem para o pós-parto, o aleitamento e a relação emocional entre mãe e filho. O uso de ocitocina sintética ou exógena é uma prática rotineira em anestesia obstétrica. Entretanto, estudos têm sido realizados e mostrado que essa prática pode causar várias reações adversas para o para a mãe e o bebê no momento ou após o parto.
Quando é ministrada ocitocina sintética a uma mulher durante o trabalho de parto, o número de receptores de ocitocina no útero pode ser reduzido pelo corpo para prevenir uma estimulação em excesso. Isso significa que a mulher tem maiores riscos de hemorragia pós-parto, pois sua própria liberação de ocitocina, crítica nesse momento para contrair o útero e prevenir a hemorragia, será inútil devido ao baixo número de receptores. A ocitocina materna atravessa a placenta e entra no cérebro do bebê durante o trabalho, preparando o feto para o parto ao aumentar a resistência dos tecidos à falta de oxigênio e ao trauma do nascimento. A ocitocina sintética, porém, não tem a capacidade de atravessar a parede placentária, e não atingirá o organismo do bebê. Esse fato deverá trazer algumas consequências adversas para o recém-nascido já que o consumo de oxigênio em seu cérebro não irá diminuir.
Portanto, é preciso esclarecer as dúvidas, desfazer os mitos e estimular a prática de partos humanizados. Além disso, caso seja realmente necessário partir para o uso de ocitocina sintética no trabalho de parto, esse uso deve ser bem manejado e controlado para atenuar as possíveis reações adversas.
Parabéns pela postagem!
REFERÊNCIA:
YAMAGUCHI, Eduardo Tsuyoshi; CARDOSO, Mônica Maria Siaulys Capel; TORRES, Marcelo Luis Abramides. Ocitocina em cesarianas: qual a Melhor Maneira de Utilizá-la?. Rev. Bras. Anestesiol., Campinas , v. 57, n. 3, p. 324-350, June 2007 . Available from . access on 26 Apr. 2015. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-70942007000300011.
Já tinha lido muita coisa sobre parto humanizado, mas nunca tinha visto esse assunto relacionado a ocitocina. Parabéns a vocês, mostraram que o conhecimento bioquímico pode ser usado para a humanização do SUS. Gostaria de continuar essa linha de raciocínio e trazer uma outra linha de pensamento: A ocitocina x amor materno. Pesquisando um pouco pude constatar que alguns estudos indicam que a ocitocina também pode ser responsável por transformar experiências potencialmente estressantes em oportunidades para expressar amor e alegria. Para muitas mulheres, o parto é uma experiência incrivelmente estressante que poderia facilmente dar origem a distúrbios de estresse pós-traumático, mas a ocitocina parece desempenhar um papel em ajudar uma nova mãe a gerenciar ambas as respostas emocionais e fisiológicas a uma experiência menos estressante e impedir depressão pós-parto. A ocitocina também ajuda a reprimir as lembranças da dor do parto tornando mais provável que uma mulher vai passar por tudo de novo e ter mais filhos. Essa substância é às vezes chamada de "hormônio de ligação". Para a sobrevivência dos mamíferos é fundamental que a mãe comece a nutrir e passar para os seus filhos imediatamente após o nascimento e os estudos revelaram que a ocitocina parece ser responsável por essa reação. É claro que para muitos bebês humanos o estabelecimento de uma ligação tão imediatamente após o nascimento não é uma questão de sobrevivência, mas os efeitos da ocitocina no cérebro ainda desempenha um papel importante no estabelecimento comportamental materno e o vínculo entre mãe e bebê.
ResponderExcluirMais uma vez parabéns pelo post.
Qualquer dúvida sobre esse tema olhem esse artigo:
http://periodicos.puc-campinas.edu.br/seer/index.php/cienciasmedicas/article/viewFile/1214/1189
Ótima postagem.
ResponderExcluirDeixou bem clara a razão de os defensores do parto humanizado serem tão contras o uso de ocitocinas sintéticas.
A ocitocina, como vocês já falaram no primeiro post, é responsável por um certo estado de euforia na mãe durante e depois do trabalho de parto, entretanto, alguns estudo indicam que o mesmo efeito não conseguido com o uso da ocitocina sintética, já que esta tem administração intravenosa e não chega ao cérebro.
Além disso, como a ocitocina vai ser administrada a mulher não chega a ter o pico de ocitocina natural, podendo dificultar a ligação da mãe e do filho.
Infelizmente, a ocitocina sintética é a prova que apenas nosso organismo consegue produzir as formas perfeitas e em quantidades ideias das diversas substâncias necessárias ao longo da vida.
Até a próxima.
GRUPO A
Grupo J
ResponderExcluirÓtima postagem! Parabéns..
A atuação desse hormônio no trabalho de parto depende de receptores presentes no útero. Quando inicia a gravidez, não existem receptores no útero para a ocitocina. Estes receptores vão aparecendo gradativamente no decorrer da gravidez. Quando a ocitocina se liga a eles, causa a contração do músculo liso uterino e também, estimulação da produção de prostaglandinas, pelo útero, que ativará o músculo liso uterino.
A ocitocina materna atravessa a placenta e entra no cérebro do bebê durante o trabalho, agindo para proteger as células cerebrais fetais “desligando-as” (o cérebro do recém-nascido é bem mais resistente à ausência de oxigênio quando seus neurônios estão adormecidos graças ao hormônio materno) e diminuindo o consumo de oxigênio em um momento em que os níveis de O2 disponíveis para o feto são naturalmente baixos. Portanto, o hormônio materno prepara o feto para o parto, aumentando a resistência dos tecidos à falta de oxigênio e ao trauma do nascimento.
Porém há a ocitocina sintética, utilizada para induzir o trabalho de parto quando este ainda não ocorreu, ou quando o médico avalia que o processo está muito demorado utilizando a ocitocina para acelerar o processo.
Indicações para Indução do Parto:Rotura prematura das membranas;Comprometimento fetal em potencial (CIUR acentuado, sofrimento fetal crônico);Condições maternas (diabetes tipo I, doenças renais, patologia pulmonar, hipertensão específica da gestação e hipertensão crônica);Síndrome anti-fosfolipídica;Suspeita clínica de corioamnionite;Descolamento prematuro da placenta e morte fetal.
Até a proxima...
O trabalho que estão realizando aqui é bem interessante (ah, não tinha falado ainda, então aproveito o momento, a arte gráfica que estão usando esta muito bonita). Nesse ponto da superutilização da ocitocina dentro do parto pelos médicos nos leva ao questionamento de que forças levam a médicos a realizarem esse procedimento que nós parece evidente ser mais prejudicial ao paciente (tanto mãe quanto bebê) do que trazer benefícios, principalmente quando transformado em rotina. O alerta que trazem nos lembra de que devemos na nossa prática futura como médicos nos orientar na direção do bem-estar do paciente e sempre se atualizando e reciclando para não continuar realizando procedimentos desnecessários apenas porque tradicionalmente se faz assim.
ResponderExcluirGRUPO E:
ResponderExcluirEssa postagem dialoga muito com as nossas aulas de Atenção Primária em Saúde e Redes de Atenção no SUS, dentre elas a Rede Cegonha. Percebe-se uma tentativa do Ministério da Saúde de quebrar paradigmas, no caso, da patologização e medicalização do parto. O parto é um processo fisiológico da mulher, não é doença que deve ser tratada. Porém, é um processo fisiológico que exige um acompanhamento mesmo antes da mulher engravidar, sendo estabelecida toda uma rede capaz de acompanhar as futuras mães, para que o parto seja vivenciado segura e proveitosamente, como uma experiência única para a mulher e seu(ua) acompanhante. Sobre a postagem, certas políticas da Rede Cegonha, preveem o uso de ocitocina em casos restritos, se comprovado tempo exagerado de parto em doses individuais e específicas para a mulher. Porém, foi necessário notificação da OMS e do Ministério da Saúde para coibir esse mau uso da ocitocina sintética, responsáveis por um processo de parto ainda mais doloroso e que pode levar a sérias complicações no parto e no pós parto, tanto para a mãe, quanto para o bebê.